segunda-feira, 21 de maio de 2012

Não mais necessário

Hoje tive um pesadelo. Eu finalmente chegava, estava ali, transpirando cansaço, à sua espera. A longa espera, aquela que achei que nunca findaria. Estava ali e você não vinha. Pior, você sequer me alertava do desencontro. Me deixava parada, sozinha e muda no desconforto da dor, onde nada se encaixa, onde nosso simples respirar denuncia fragilidade e todo o resto parece não nos pertencer. Permanecia ali por tempo indeterminado, um tanto anestesiada para pensar em pensar qualquer coisa. Um bocado ferida pra ousar qualquer movimento. Entrelaçara meus braços sob o peito para em vão segurar o que escapava, o muito de mim que se esvaía a cada grito que conseguira calar entre um soluço e outro. A dor existe, sabe. Existe e eu a conheço. Ela preenche cada pedaço, permeia as lembranças, habita nos sentidos. Ela tem seu cheiro, seu toque, seu timbre, os traços e expressões do seu rosto. Ela flui de você, meu caro.
Não sei dizer quanto tempo fiquei ali, na agonia insensata do 'quase', na iminência de te perder para sempre, de te deixar escapar pelas frestas que tanto lutei para fechar... No meu mundo moldado para te pertencer. Excruciante como uma parte que nos falta. Você e sua ausência, confirmando meus pontos fracos, falhos, atestando meu desespero.

Acordei aos gritos. A dor ali estacionada, forte como há tempos não me assaltava. Depois o alívio... A prece clara, alta. A certeza do aprendizado do muito que você me ensinou. O conforto de te saber distante, mas de me saber serena quanto a isso. De me saber amante, mas livre para seguir. De te saber meu professor, porém não mais necessário. 

Raquel Barroso

quinta-feira, 10 de maio de 2012

É um tal de mal me quer

Comumente me flagro fazendo perguntas já corriqueiras acerca de um assunto igualmente habitual: por que será que alguém decide não gostar de você simplesmente por não gostar?  É um mal querer gratuito, um desgosto sem razão. "Nosso santo não bateu", diz a maioria. "Fulaninha não deve prestar... Olha como se veste.", "Ouvi coisas terríveis a respeito de Sicrano...", as motivações são várias. É a sociedade do desafeto, do desamor, do despropósito. Passou até a ser aceitável e compreensível alguém resolver te alvejar moralmente somente pelo fato de não ir com sua cara ou de te responsabilizar afetivamente por ter levado um pé na bunda do namorado, pelo emprego que perdeu, pela relação que não vingou, porque tropeçou andando na rua, porque o horóscopo não foi bom, porque tá de tpm, dentre outros muitos motivos que nada justificam. 
É tanta gente promovendo a si, fazendo da própria fé armadura de combate, firmando ódio por desacertos infantis e rancores passados; é tanta ausência de humildade, que raramente se chega ao perdão e fatalmente se aproxima do caos.
Tem tanta coisa maior do que impulsionar desafetos, tem tanta vida por trás de quem vive pra desmerecer a vida do outro... Temos tanto a aprender quando nos propomos a desculpar, a relevar, a não tomar pra si. Tem tanto amor por vir quando a gente passa a abençoar até o que já não é bem vindo...

Raquel Barroso

terça-feira, 8 de maio de 2012

Ao acordar


É que hoje eu acordei me achando... 
Aliás, me achando não, me sabendo.
Dona e detentora do meu espaço. 
Guia da minha própria cabeça. 
Bússola do meu próprio destino.
Acordei assim disposta a ser mais
Mais firme, mais forte, mais mulher
Acordei querendo cores,
promovendo amores,
mas sem esquecer de me amar.
Acordei sem saber que dormia há tempos,
e mal sabia das promessas guardadas pra mim
Nem sonhava no tanto que eu podia
No tanto arquitetado pro meu bem
Acordei e lembrei de soltar
as amarras que me detinham
As cordas que me pressionavam os pulsos
O peso que trazia no coração.
Acordei sem esperar ou planejar
E me peguei feliz como não lembrava de ter sido
E no caminho certo, que não lembrava de ter seguido
E assim plena, sem saber se era merecido.
Acordei e, pasme, apesar dos pesares
De todas as dores, das coisas que ainda não sei
Do mundo que às vezes nos engole...
Fosse a manhã chuvosa
ou ensolarada
Dei de achar
que merecia ser amada.


Raquel Barroso

sábado, 5 de maio de 2012

Perdão já é amor


"Guardar ressentimento é como tomar veneno e esperar que a outra pessoa morra."  - Escutei ontem uma variável desta frase que eu já gostava, mas que nem sempre consegui pôr em prática. Na verdade, a maioria de nós guarda tanta dor, tantas lástimas, tanta ira e tanta mágoa, que mal conseguimos distinguir luz de treva. 
De fato, não é fácil. Se nem sempre é assim tão simples amar quem nos ama, imagine então amar quem tudo faz para não merecer sequer um aceno.
O notável Lord Byron dizia que "a recordação da felicidade já não é felicidade, mas a recordação da dor ainda é dor". Penso que ele estava certo, como também penso que por isso mesmo faz-se urgente transformarmos nossos maus momentos, nossos desafetos, as injustiças que nos foram cometidas, as traições que nos aplacaram e o amor que nos foi negado em perdão. 
Não perdoar pra silenciar o ser, não perdoar para continuar a ser machucado, não perdoar com o objetivo único de obter o arrependimento do outro. Perdoar por ser o único caminho que nos leva ao nosso íntimo e nos conforta, independente da postura do mundo ou do autor da ofensa, pois nos abre as portas de uma realidade menos escura, que nos torna mais sensíveis e receptivos ao bom, ao bem, à Deus.
Mas aí você me diria que é possível o perdão, mas não o amor. Diria isso de forma convicta e certo da impossibilidade de tal sentimento. Acho que até eu pensaria e diria o mesmo.
Mas o que a gente não sabe, o que a gente sequer supõe, o que nossa alma ainda não consegue distinguir é que perdão, meus caros, perdão já é amor.

Raquel Barroso

Ps: And I'll keep trying to free my soul. Thanks, God.